quinta-feira, abril 08, 2010

O Culto da Mãe Soberana - Uma Festa Religiosa e Pagã

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         Fotografia da Festa da Mãe Soberana de 1895



Festa da Mãe Soberana, a maior manifestação religiosa do Sul do País e que atrai à cidade milhares de peregrinos e turistas. Com o objectivo de assinalar os quatro séculos e meio de devoção à Nossa Senhora da Piedade, padroeira de Loulé, a Câmara Municipal de Loulé e as paróquias de S. Sebastião e S. Clemente prepararam um vasto programa que se irá prolongar até ao próximo ano.
Estão previstas, portanto, diversas actividades de carácter religioso, cultural e social que passam por exposições, conferências, concertos e encontros.

Outras das iniciativas da organização serão a publicação de um livro alusivo ao Culto à Mãe Soberana, cunhagem da Medalha Comemorativa desta efeméride, a emissão de um Inteiro Postal dos CTT comemorativo e a designação da Mãe Soberana como patrono da Escola EB 1, nº 1 de Loulé.

A Câmara vai aproveitar esta ocasião para inaugurar o Centro Social e Paroquial de Loulé, um equipamento de carácter social que pretende ser um lugar de apoio às actividades assistenciais, culturais e religiosas, das paróquias e cidade de Loulé. Este será um espaço de formação cristã para crianças, jovens e adultos bem como de apoio a sectores importantes como a juventude e família e apoio a carenciados.


Festa Religiosa e Pagã 

As festividades da Mãe Soberana constituem uma tradição que data do século XVI, com provável origem em 1553, data oficial da edificação da capela.

Esta festa decorre entre o Domingo de Páscoa e os quinze dias posteriores e é dividida em duas fases: a Festa Pequena e a Festa Grande. Num primeiro momento, que coincide com o Domingo de Páscoa, tem lugar a descida do cerro da imagem da Nossa Senhora em direcção à Igreja de S. Francisco.

Quinze dias depois realiza-se aquela que é considerada a Festa Grande. É o adeus da Padroeira à sua terra e o regresso à sua pequena ermida que, a poente, se ergue sobranceira a toda a cidade.

Nesta manifestação de grande culto pela fé existem duas vertentes distintas: a religiosa, no seu mais sentido significado, e a profana, na mais ampla e liberal exteriorização popular. 
Assim, no Domingo de Páscoa a descida da Santa obedece a uma marcha fácil de organização profana, a marcha acelerada a conduzir o pesado andor até à Igreja de S. Francisco. Durante os quinze dias da sua estadia neste local, as novenas e os sermões conduzidos por afamados oradores sacros perfazem uma vigília religiosa de grande poder espiritual.

O último dia é o da Festa Grande. Após a saída da Igreja de S. Francisco, a procissão percorre as ruas do centro de Loulé, ao ritmo de marchas executadas por bandas de música, nomeadamente o centenário Hino da Mãe Soberana. No espaço circundante ao edifício erguido em memória do Eng.º Duarte Pacheco, tem lugar a missa campal.

Depois desce até ao Convento de Stº António, seguindo-se o caminho de volta ao Santuário. Os oito homens carregam o andor, vestidos de calças e opas brancas, sobem o íngreme cerro, ao ritmo da música, e com a população a exibir-se em manifestações diversas mas verdadeiramente sentidas. Em tempos passados, estes homens eram considerados seres com capacidades sobre-humanas. Mas esta tradição, que é transmitida de geração em geração, de pais para filhos, tem vindo a perder-se. No entanto, há uma consideração especial por parte de todos os louletanos relativamente a estes homens que carregam a santa ao longo desta subida íngreme num ritmo acelerado.

A escalada do caminho que dá acesso ao altar da Nossa Senhora da Piedade é um documento espantoso da fé cristã nesta terra. Ao esforço gigantesco dos homens que transportam a Virgem, alia-se a força espiritual dos muitos fiéis que, em vivas à Nossa Senhora, em passo vivo e na cadência musicada dos homens da banda, vão “empurrando”, no calor da fé e calçada acima, o pesado andor da padroeira.

Este cenário imenso da religiosidade louletana, de características tão locais como únicas, só pode ser sentido na alma de cada crente, quando vivido. Uma vivência feita de fervor religioso e de testemunho cristão, cuja explicação reside unicamente na essência dogmática da própria fé.

Este quadro indescritível, soberbo e ímpar só pode encontrar comparação no fausto portentoso das procissões do Norte de Portugal, nomeadamente do Minho.


As Lendas

As lendas em torno da Mãe Soberana são anteriores ao final do século XVI. Conta-se que, determinada donzela, de quinze anos de idade, uma tarde, ao depor flores num modesto altar que seus pais mandaram edificar numa gruta, determinado fidalgo, endoidecido pela beleza da menina, pretendeu violentá-la. Resistindo à força do fidalgo, a menina pede ajuda à Virgem da Piedade. O milagre opera-se: a menina sai ilesa do atentado e o fidalgo, cheio de vergonha e remorsos, mete-se num convento, onde morreu frade. 

A fama da Santa milagreira toma foros de Soberana e passa a ser idolatrada. A pequenina capela da gruta muda-se para cima do íngreme cerro.

Mais uma lenda: pretendia-se erigir, no sítio da gruta, uma igreja para dar condigna morada à Virgem da Piedade. Os operários trabalhavam durante o dia e, como à noite deixavam no local da obra as suas ferramentas, ficavam espantados quando no outro dia verificavam que elas apareciam no cume do cerro. Para esses trabalhadores havia apenas uma explicação: o poder milagroso da Santa que não queria a sua igrejinha escondida, metida numa cova; queria-a num local bem alto para que a adoração fosse mais visível.

As ferramentas dos trabalhadores acabam por ficar lá em cima e a igreja faz-se. Corria o ano de 1553 quando é concluído a pequenina ermida.

Com o passar dos séculos e como resultado da grande aceitação popular, os responsáveis religiosos implementaram a construção de um imponente santuário de planta centralizada, cujo projecto, de 1970, da autoria do Arq.º Nereus Fernandes, previa a destruição da vizinha Ermida de Nossa Senhora da Piedade. Depois de muitos anos de interrupção, a obra recomeçou em 1988 com o Arq.º António Serrano Santos. Em 1994 inaugurava-se finalmente o Santuário e a pequena Ermida acabou por não ter sido destruída, procedendo-se a partir de então à limpeza e consolidação da sua ornamentação interior. 





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